domingo, 29 de agosto de 2010

Não é assim.

Creio que a abstinência opcional da realidade seja a maior maneira de falsa auto-proteção que os sensíveis sociais adquirem com o passar do tempo. Ou melhor dizendo, o descaso e a deslealdade são escondidos pela carência do indivíduo.

Você acorda. Escova os seus dentes e senta-se para o café. Tudo isso pois tudo isso tem de ser feito. Afinal, todos fazem. Vai para o trabalho, e durante o caminho já fatigante, você se força a aceitar ou até mesmo gostar, de situações que apareceram na sua vida. Afinal, todos passam por isso um dia. Você empurra com a barriga o seu trabalho remunerado por si próprio, mas que até dá para pagar as contas lá de casa. E daqui seis mêses, você poderá ter trinta dias de descanso. Afinal, todos os seus amigos trabalham para isso. Mas, felizmente, hoje é sexta-feira! Tem aquela festa que a sua mulher tanto esperou, só para usar aquele vestido vermelho. E você, encontrar os seus velhos amigos, com as mesmas intenções de sempre: o nada. A festa acaba, vocês transam em casa como de costume, e segunda-feira será tudo igual novamente. Talvez, em algum desses seus trinta dias de férias, você pare para pensar. E pense que em todo momento, pensou nada. Que o seu tudo, foi nada. Que tudo não faz sentido algum. Você se permitiu. Afinal, a vida é assim, não é mesmo?

A crítica não é ao estilo de vida burguês. Ou aquele que a maioria busca. Mas sim, ao modo como se leva a vida, esteja ela como estiver. O fato de viver de olhos fechados, talvez seja para sentir menos dor. O ser humano vive em busca de métodos que façam com que a vida fique mais leve, como a religião. Pior do que essa, só a opção de se fazer inferior a verdade de si mesmo, mesmo esta não sendo uma conquista metódica.

E por fim:

"O homem é mais sensível ao desprezo que vem dos outros do que ao que vem de si mesmo."

Nietzsche
"Penso noventa e nove vezes e nada descubro; deixo de pensar, mergulho em profundo silêncio - e eis que a verdade se me revela."

domingo, 8 de agosto de 2010

Para o amor.

Eu vou te contar. Mas em tom baixo, de longe do seu ouvido, que é pra você me ver bem. Para ser sincera, eu ainda estou pensando nas palavras certas, porque eu não quero te dar meus erros, meus enganos. Mas eu só tenho a vontade da informação. Te informar quem sou, na verdade.

Espero que esteja sentado. Não quero te assustar. O que eu quero dizer é que você conheceu uma pessoa estranha, não a mim. Você não me conheceu porque hoje eu me condensei em você. Hoje eu já mudei.

Não queria que você se assustasse por eu já ter sido duas. A diferença é que o que eu sou hoje não é mais meu. É seu. Não sou você. E me sinto tão você por querer te ser em mim. Te ser. Te tecer em mim. Te ter. Eu me sinto você, por te amar assim.

Pequenos.

Além de cor de laranja, a minha infância também foi grande. Tudo era maior, como costuma ser para as crianças. As paredes nos davam um espaço imenso. Talvez um espaço correspondente ao espaço livre que eu tinha dentro de mim. Aquele tipo de liberdade que vem da ingenuidade.

Com o passar do tempo, o espaço foi se comprimindo. Gradativamente. Ao mesmo modo que um balão infla, mas para isso precisa de ar. O mesmo ar que comprime o interior daquela matéria.

A gente deveria se sentir assim, em alguns momentos. Nos faz perceber que éramos grandes enquanto pequenos. Que talvez o que achamos essencial, como o ar para o balão, não seja de fato assim. O balão continuará sendo balão. Com ou sem o ar que o comprime. Isso acontece pela lei natural da vida. Estamos definitivamente trancados. Sem ninguém impor. Sem ninguém pedir. Sem querer. Apenas estamos.

terça-feira, 3 de agosto de 2010

Minha mentira.

"Mentimos para proteger alguém", era o que estava escrito na sinopse de um livro solto na livraria. Me arrependo de não ter anotado nada além da frase na memória, folheado o livro e procurado mais explicações que inexplicavelmente serviriam de entendimento para futuras auto-perguntas.

Lendo esta frase, eu pude resumir as minhas mentiras em proteção, e aí senti um certo conforto falso. Era o conforto de agir por amor, digamos assim, com atos relativamente grandes. Mas era falso por se tratar de uma coisa feia, que é a mentira.

Eu me senti como uma mãe que ainda não pariu, por descobrir que muitos dos meus erros não foram cometidos pensando apenas em mim, mas em quem amo também. Obviamente tal argumento está descartado das justificativas dos meus atos passados. E dos futuros também, é claro. Agi por amor sem saber e com um número incontável de filhos que tive. Eu acabei me tornando filha de mim mesma, mas isso não interessa.

O que interessa é saber que até o pior de mim talvez seja feito de amor também. E a minha mentira ou a minha verdade continuarão intactas, independentemente da minha crença.